segunda-feira, 12 de julho de 2010


AMARgo

Sou o desejo do outro embebido no que penso que sou, mesmo que seja apenas o que sinto que sou. Sei que sou, soube que fui e saberei que serei e, isso ninguém me arranca. Arrancaram me os sonhos, mas continuo sendo alguém sem sonhos, arrancaram me o amor, mas permaneço sendo alguém sem amor. A única coisa que não podem me arrancar é o “ser”, o resto não tenho tanta certeza. Já perdi tanto que estou calejada, não sinto a mesma dor, uma espécie de anestesia toma conta do meu ser e, continuo sendo... Desconheço a fonte da energia que me sustenta, às vezes acho que fica guardada atrás de um porta retrato de família sobre a mesa de centro, esquecido dos olhares e cheio de poeira. Quantas vezes me senti cansada de andar, sentada numa cadeira de balanço, com um grito silenciado nos olhos cheios de lágrimas, que não conseguem cair por amor aos olhos tristes que lhe deram vida. Sinto o peso nos ombros que me rouba o sorriso do rosto, o peso de não ter siDo sendo o que desejava ser. Desejei quando ainda acreditava que os pais tinham fantasias de super-heróis guardadas em um baú no porão velho e escuro da casa. Preciso tanto de um sopro de vida, sopraram me tanto, que me tiraram do caminho, estou perdida e já não sei se quero me encontrar. Tenho medo do que verei, evito espelhos, tirei todos do meu quarto, eles me afrontavam, como eram cínicos aqueles espelhos, decidi então me livrar de todos, mas eles me perseguem, vejo os em todos os lugares e, logo desaparecem antes que eu consiga quebrá-los. Ontem inesperadamente tive um sonho, sonhei que ontem era hoje e, hoje não sei se estou vivendo o resto do sonho de ontem. Estou perdida no tempo, sinto que um velho relógio sem corda está preso a um cavalo selvagem que galopa enlouquecido pelos pastos. O relógio está parado, não consigo ver as horas que os ponteiros marcam, sinto que se conseguir ver ele volta a funcionar, e aí o que farei com as horas que ainda me restam? Se tenho passado a vida contando os segundos e ouvindo um “ tic- tac “ que não sai da cabeça. Quantas primaveras passaram sem que eu sentisse o perfume das flores. Quando caminho pelas ruas sinto que as flores se fecham, carrego nos passos uma maldição lançada quando resolvi começar a sonhar, maldição esta que se quebraria com o verdadeiro amor, e esse me foi negado, quebrado está meu coração e não consigo mais lhe colar os pedaços. Neste momento escuto um pássaro, e não quero saber o que canta e nem se está triste porque a amada o deixou, não quero ouvir ninguém, o mundo me parece incompreensível. As palavras, quanta mágoa tenho delas, elas que me feriram, traíram -me , agora me recuso a dizê-las, estou ilhada no silêncio que me atormenta. Sinto que as palavras querem sair, não sei por quanto tempo vou conseguir deixá-las presas e inaudíveis.
Um sonho ainda me resta, , como um prêmio de consolo ao último competidor, sonho em ter meus sonhos de volta, sonhos roubados, perdidos, esquecidos ao lado das pedras soltas no caminho. Por enquanto fica o gosto amargo do café frio esquecido na garrafa e, na boca um cigarro queimando sem ter forças para tragá-lo, como fiz com a minha vida e, há de ficar o gosto, só o gosto que logo o tempo se encarregará de ser esquecido.

Nenhum comentário:

Postar um comentário