segunda-feira, 12 de julho de 2010

A Vida Imita a Arte


Teresinha
Chico Buarque
Composição: Chico Buarque/Maria Bethânia

O primeiro me chegou como quem vem do florista
Trouxe um bicho de pelúcia, trouxe um broche de ametista
Me contou suas viagens e as vantagens que ele tinha
Me mostrou o seu relógio, me chamava de rainha
Me encontrou tão desarmada que tocou meu coração
Mas não me negava nada, e, assustada, eu disse não

O segundo me chegou como quem chega do bar
Trouxe um litro de aguardente tão amarga de tragar
Indagou o meu passado e cheirou minha comida
Vasculhou minha gaveta me chamava de perdida
Me encontrou tão desarmada que arranhou meu coração
Mas não me entregava nada, e, assustada, eu disse não

O terceiro me chegou como quem chega do nada
Ele não me trouxe nada também nada perguntou
Mal sei como ele se chama mas entendo o que ele quer
Se deitou na minha cama e me chama de mulher
Foi chegando sorrateiro e antes que eu dissesse não
Se instalou feito posseiro, dentro do meu coração



Quem não se lembra da “Teresinha de Jesus”, cantada nas rodas por crianças de pés no chão e corações cheios de sonhos. Terezinha de Jesus... Podia ser do João da barbearia da esquina, ou quem sabe do Seu Manuel, padeiro lusitano, que enche os olhos e a barriga de toda a vizinhança, mas não, Terezinha é de Jesus, humano divino, que preservou sua castidade, não caiu em tentação, ideal de perfeição. Teresinha é histérica, não quer os homens de carne, osso e suor, finge tão bem que se convence que quer ter o que nunca quisera, e quando chega a ter, corre assustada.

Buarque e Bethânia se entregaram ao charme e sedução da “nossa” Teresinha ( nossa , porque cada um a tem de forma peculiar) que com poesia e em cima de um caixote de madeira anuncia aos quatro cantos a sua saga amorosa, os homens que em sua vida entraram e os que ela mandou sair.

O primeiro homem (provavelmente obsessivo) chegou pagando, presenteando-lhe na tentativa de tamponar a falta, enumerando suas qualidades e virtudes, mas Teresinha, assustou-se, era muito próximo ao que desejava , onde ficaria o gozo? Era necessário colocar este homem para fora do seu caminho, e a ele ela disse não, antes que fosse desmascarada, e que bela máscara Teresinha usava, a vida imita a arte e a arte se rendia ao espetáculo que era Teresinha.

Então apareceu o segundo, com passos pouco firmes, com a voz embriagada, desta vez, Teresinha, assustou-se menos, porque ele a deixava confortavelmente incomodada na posição de vítima, e como era bom estar ali, mas o boêmio fez sair do seu semblant, chamou-a de perdida e vasculhou o seu passado, no entanto o infeliz deste homem não dava conta da sua falta, e como lhe faltava! Ele também ouviu seu não e trocando os passos foi embora.

O terceiro, ah o terceiro! Na verdade nunca chegou realmente, nem seu nome Teresinha sabia, mas sabe que é ele que continuará esperando, aquele que vai responder a eterna questão da histérica. Sou homem ou sou mulher? O terceiro é aquele que a nomeará uma mulher e para quem não poderá dizer não. Mas e se chegar o terceiro? Pobre Teresinha! Terá que começar a esperar o quarto, enquanto arranham teu coração.

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